Brigas em grupos de WhatsApp geram processos judiciais em condomínios
Discussões, ofensas e acusações em grupos de moradores têm levado vizinhos aos tribunais. Especialistas alertam: o ambiente virtual não está livre das consequências legais.

Conflitos em grupos de WhatsApp de condomínios geram disputas judiciais e acendem alerta sobre responsabilidade digital
O que começou como uma ferramenta para facilitar a comunicação entre vizinhos tem se transformado em um cenário recorrente de litígios judiciais: os grupos de WhatsApp de condomínios. Em São Paulo, o número de processos relacionados a ofensas, calúnias e difamações praticadas nesses ambientes virtuais vem crescendo, trazendo à tona a importância da responsabilidade digital e da boa convivência entre condôminos.
Segundo levantamento do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao menos 20% dos processos envolvendo questões condominiais no estado têm como ponto de partida mensagens trocadas em grupos de WhatsApp, criados originalmente para comunicação administrativa. Em muitos casos, o espaço destinado a avisos sobre manutenção, assembleias e convivência pacífica tem sido deturpado, tornando-se palco para acusações graves, desentendimentos pessoais e agressões verbais.
Especialistas em direito condominial alertam que, embora as conversas ocorram em ambiente informal, as consequências legais são reais. “O grupo de WhatsApp, mesmo sendo virtual, é uma extensão da vida em condomínio e está sujeito às normas do Código Civil e da Constituição Federal. A liberdade de expressão não pode ser confundida com o direito de ofender”, afirma o advogado Érico Rodrigo de Oliveira, especialista em direito imobiliário e condominial.
Em ações judiciais analisadas pelo TJSP, moradores chamaram vizinhos de "mau caráter", acusaram o síndico de “corrupção” sem qualquer comprovação e publicaram informações sigilosas, como valores de inadimplência ou dados pessoais. Além de ações cíveis por danos morais, esses atos podem configurar crimes como injúria, difamação e calúnia, previstos no Código Penal.
“Quando uma pessoa é exposta ou ofendida em um grupo de WhatsApp, o dano moral está configurado. Ainda que o grupo seja restrito, o impacto na imagem e na honra do ofendido é suficiente para gerar reparação judicial”, explica Oliveira.
Outro ponto de atenção é a responsabilidade do síndico e da administradora. Em muitos condomínios, o grupo é criado oficialmente pela gestão condominial, o que impõe o dever de mediação e moderação. Se o síndico se omitir diante de discursos ofensivos, ele pode ser responsabilizado solidariamente por danos causados.
Além disso, o compartilhamento de mensagens contendo dados sensíveis, como informações financeiras, processos judiciais ou imagens sem consentimento, pode configurar infrações à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
“A exposição indevida de dados de condôminos é passível de sanções administrativas e judiciais, tanto para a pessoa que compartilha quanto para a administração que permite esse tipo de conteúdo no grupo”, complementa o advogado.
Para minimizar conflitos, especialistas recomendam que os condomínios adotem normas de conduta digital, inseridas no regulamento interno ou aprovadas em assembleia, e que os grupos de WhatsApp tenham uso limitado à comunicação institucional. “O ideal é que esses grupos sirvam apenas para comunicados da administração. Qualquer debate deve ser conduzido de forma controlada, preferencialmente por canais oficiais, com regras claras”, orienta Oliveira.
Outra medida eficaz é a intermediação profissional de conflitos, por meio de mediação extrajudicial ou apoio psicológico, a fim de evitar a judicialização excessiva das relações interpessoais.
À medida que o ambiente digital se consolida como extensão da convivência em condomínio, cresce também a necessidade de alfabetização digital e empatia entre os moradores.
“É preciso entender que, mesmo por trás de uma tela, estamos lidando com pessoas, com regras e com consequências. O condomínio não termina na porta da unidade; ele se estende também ao grupo de WhatsApp”, conclui o especialista.
COMENTÁRIOS